Heitor, certa vez, entristecido com os favores que a vida lhe prestara até então, resolveu tomar consigo todas as dores acumuladas em seu coração. No compartimento secreto onde somente ele e a alma gêmea da vez compartilhavam, Heitor sabia que podia entregar a chave a um renomado especialista nas doenças do coração, seu amigo e psicólogo Dr. Phillip.
Naquela manhã fria, onde o sol se impunha como uma virgem nua, visivelmente tínhamos a entrega de uma alma receosa. Heitor, a cada minuto passado na sala de espera, vigorava em seus gestos a tendência suicida perfeita. Mas a divina graça, concedida pelo chamado de seu nome pela secretária Ofélia, relembrou que até os depressivos têm seu anjo da guarda.
Sentado lá, naquela poltrona nova com o confortante cheiro do couro, um homem entregue à sorte da competência de outro.
"Eu estava bastante errado em pensar que um relacionamento se tratava de entrega, de reciprocidade.
A vida tem me ensinado, e com um gosto bem amargo, que não é nada disso. Um relacionamento nada mais é que uma convenção.
É um simples acordo, e que isso esteja implícito, com fins meramente pessoais, e por vezes sociais. Não se trata de bem estar, de jeito nenhum. Creio que nunca em minha vida me senti tão incomodado por estar responsável pelo que a outra pessoa vai pensar.
É como uma via de duas mãos onde temos de estar em dia com nossas obrigações. Se por um lado precisamos entender a necessidade da outra pessoa, atendendo e correspondendo aos seus sentimentos, por outro precisamos nos desvenciliar um pouco dessa figura romântica.
Relacionamentos raramente têm a ver com amor. Na minha opinião, o amor nada mais é do que um consolo para pessoas fracas, que se apóiam nele e buscam ali uma fuga da realidade. O amor é uma droga. Relacionamentos dizem mais respeito ao seu interesse momentâneo, e possivelmente os planos que você constrói em cima de uma pessoa nada mais são do que sua declaração de insanidade."
Como em um flerte ao acaso, providenciado pela necessidade afetiva, Dr. Phillip e Heitor introduzem, cada qual ao seu modo, suas próprias idéias. Da mesma maneira que dados viciados são lançados em um jogo alto.
Seu diálogo encontrava abrigo quando os ecos de suas palavras refletiam suas mesmas incertezas. Em um silêncio profundo, intercalado por vazios ''prossiga'', Dr. Phillip esclarecia de uma maneira quase telepática os questionamentos, e a esta altura da vida, as quase certezas, de Heitor.
Instigando em espírito alheio, como um cão que vaga no campo vizinho, permitiu seu paciente concluir, de modo superficialmente unilateral
"Construir sonhos em cima de alguém é um atestado para a infelicidade. Podemos perceber, com o tempo, que se ater aos desejos do outro é negar a si mesmo. É assumir uma postura inferior, de submissão. E isso não é se entregar, é se render. Você espera em contrapartida receber o mesmo esforço, mas não é o que acontece - por isso é uma rendição, só há um lado nessa história.
É uma visão dura e realista, eu sei, mas essa é que é a verdade. Não tenho simpatia por atitudes infantis, irreais, ou seja lá o que for que isso tenha a ver com o amor. Mas é isso que me parece, uma atitude ultrapassada, impensada, infeliz. "
Naquela manhã fria, onde o sol se impunha como uma virgem nua, visivelmente tínhamos a entrega de uma alma receosa. Heitor, a cada minuto passado na sala de espera, vigorava em seus gestos a tendência suicida perfeita. Mas a divina graça, concedida pelo chamado de seu nome pela secretária Ofélia, relembrou que até os depressivos têm seu anjo da guarda.
Sentado lá, naquela poltrona nova com o confortante cheiro do couro, um homem entregue à sorte da competência de outro.
"Eu estava bastante errado em pensar que um relacionamento se tratava de entrega, de reciprocidade.
A vida tem me ensinado, e com um gosto bem amargo, que não é nada disso. Um relacionamento nada mais é que uma convenção.
É um simples acordo, e que isso esteja implícito, com fins meramente pessoais, e por vezes sociais. Não se trata de bem estar, de jeito nenhum. Creio que nunca em minha vida me senti tão incomodado por estar responsável pelo que a outra pessoa vai pensar.
É como uma via de duas mãos onde temos de estar em dia com nossas obrigações. Se por um lado precisamos entender a necessidade da outra pessoa, atendendo e correspondendo aos seus sentimentos, por outro precisamos nos desvenciliar um pouco dessa figura romântica.
Relacionamentos raramente têm a ver com amor. Na minha opinião, o amor nada mais é do que um consolo para pessoas fracas, que se apóiam nele e buscam ali uma fuga da realidade. O amor é uma droga. Relacionamentos dizem mais respeito ao seu interesse momentâneo, e possivelmente os planos que você constrói em cima de uma pessoa nada mais são do que sua declaração de insanidade."
Como em um flerte ao acaso, providenciado pela necessidade afetiva, Dr. Phillip e Heitor introduzem, cada qual ao seu modo, suas próprias idéias. Da mesma maneira que dados viciados são lançados em um jogo alto.
Seu diálogo encontrava abrigo quando os ecos de suas palavras refletiam suas mesmas incertezas. Em um silêncio profundo, intercalado por vazios ''prossiga'', Dr. Phillip esclarecia de uma maneira quase telepática os questionamentos, e a esta altura da vida, as quase certezas, de Heitor.
Instigando em espírito alheio, como um cão que vaga no campo vizinho, permitiu seu paciente concluir, de modo superficialmente unilateral
"Construir sonhos em cima de alguém é um atestado para a infelicidade. Podemos perceber, com o tempo, que se ater aos desejos do outro é negar a si mesmo. É assumir uma postura inferior, de submissão. E isso não é se entregar, é se render. Você espera em contrapartida receber o mesmo esforço, mas não é o que acontece - por isso é uma rendição, só há um lado nessa história.
É uma visão dura e realista, eu sei, mas essa é que é a verdade. Não tenho simpatia por atitudes infantis, irreais, ou seja lá o que for que isso tenha a ver com o amor. Mas é isso que me parece, uma atitude ultrapassada, impensada, infeliz. "
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