sábado, 4 de dezembro de 2010

Por de trás dos altos muros do meu castelo

Me lembro quando subia aquela mesma rua pela madrugada a dentro, onde a beleza da vida toda se resumia a uma jornada noturna com os amigos bêbados em qualquer canto. Lembro-me de ter sussurrado ao vento algumas teorias sem o menor pudor, e também de como as minhas verdades se tornavam imortais.
Meus amigos me fizeram acreditar em um mundo de beleza, um lugar onde o companheirismo nunca deixaria que o marasmo de um destino qualquer lhe tocasse. Eu pensava que isso fosse durar pra sempre.
Gostava deles, realmente. Talvez pudessem não entender meu modo de apreciá-los, pois para cada gargalhada que distribuia à seus defeitos, preenchia o vazio de meus conceitos com um pouco da genialidade alheia.
Nas noites em que estávamos pertos um do outro, era como se a simplicidade adquirisse a personalidade de um ente supra-humano, e que, sem exageros, nenhum outro filho da puta poderia ser tão sortudo de viver a vida assim como nós. Exorcizávamos todos os demônios com a alma lavada.
Nesses dias eu desfrutei de uma felicidade peculiar aos mais jovens, e que às vezes fica escondida pela idade que vem. Uma felicidade que não era só duradoura, mas também completa - bastava que os nossos gostos imediatos fossem atendidos. Nenhuma fumaça de algo já muito encrustado em nossas vidas ousou ser oportunista o bastante para que ofuscasse o brilho em nosso olhar. A inocência que nos impedia de evitar o sorriso franco e sincero, sem ter de medir as próprias atitudes pelo medo da reprovação que, a posteriori, se tornaria uma cobrança visceral.
Éramos jovens, éramos felizes.
Desde então, a luz do poste que tinge de vermelho o mesmo asfalto, já não presencia a alegoria cortante dos alegres mancebos. Toda a plenitude de nossas virtudes foi jogada com as cinzas dos cigarros, tragados pelo desespero de crescer. Enfrentar a vida envolveu a separação.
Sou o mesmo observador de antes, mas a paisagem perdeu seu horizonte. A sutileza se perdeu na distorção do silêncio. O mundo me cegou ou fui eu que preferi fechar os olhos?
A memória nem sempre é seletiva, ou talvez o processo seja falho.